Juliana Trintin

O Declínio Silencioso das Marcas: Como o Foco no Curto Prazo Está Matando o Valor de Longo Prazo

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“Uma marca leva anos para ser construída… e apenas meses para ser esquecida.”


O Valor da Marca Está Em Risco — E Pouca Gente Está Percebendo

Vivemos em uma era em que o nome de uma marca pode valer mais do que fábricas inteiras. E ainda assim, em muitas empresas, a construção de marca vem sendo negligenciada. Enquanto os resultados de curto prazo dominam as reuniões, as marcas — os maiores ativos invisíveis de uma organização — estão sendo deixadas de lado, silenciosamente.

Estamos assistindo a um fenômeno cada vez mais comum: marcas sendo tratadas como commodities, loyalty em queda, e preço se tornando o fator decisivo de compra.

Mas como chegamos até aqui?


Sinais de Negligência no Branding

Mesmo grandes empresas têm demonstrado falta de estrutura e estratégia para proteger o brand equity. Aqui estão os sintomas mais comuns:

  • Gestores não conhecem os atributos da marca nem como esses atributos variam entre públicos ou ao longo do tempo.
  • Não há métricas confiáveis de lealdade e satisfação. Sem diagnóstico, não há correção de rota.
  • Marcas são avaliadas apenas por KPIs de curto prazo — como vendas trimestrais — enquanto o valor real da marca desaparece no longo prazo.
  • Promoções são lançadas sem medir o impacto na percepção da marca.
  • Falta visão de futuro: em que categorias essa marca vai competir daqui a cinco anos? Como ela será lembrada?

Essas omissões resultam em decisões desconectadas do branding estratégico — o que pode ser fatal para a sobrevivência de longo prazo da marca.


O Preço Como Vilão (Ou Sinal de Crise)

A pesquisa da Nielsen já mostrava: entre 1975 e 1987, o market share médio de grandes marcas de supermercado caiu 7%. Ao mesmo tempo, os consumidores passaram a comprar uma variedade maior de marcas por categoria.

Em outro estudo, 76% dos consumidores consideraram que todas as marcas de cartão de crédito eram iguais. Esse sentimento de “paridade de marca” é um alerta vermelho: quando o cliente acredita que qualquer marca serve, o preço se torna o único diferencial.


Promoções: A Solução Rápida Que Custa Caro

É fácil entender a tentação: promoções aumentam as vendas rapidamente. Em uma única semana, frutas em promoção podem vender 443% a mais, detergentes 122%. O retorno é mensurável, rápido e visível nos relatórios trimestrais.

Mas há um problema: promoções são facilmente copiadas pelos concorrentes. Logo, o consumidor passa a esperar descontos para comprar. As marcas entram em uma guerra de preços da qual poucas saem ilesas.

E o resultado?

  • Redução da margem de lucro
  • Erosão do valor percebido da marca
  • Transformação do produto em commodity

Pior: estudos mostram que apenas 16% das promoções realmente compensam, quando se leva em conta os custos e o comportamento de estocagem dos consumidores.


O Curto Prazo Está Matando o Branding — Literalmente

Boa parte da culpa está na pressão interna por resultados trimestrais, alimentada por acionistas e investidores. Gerentes são avaliados por KPIs de 3 a 6 meses, e poucos ficam tempo suficiente em um cargo para ver os frutos de uma estratégia de marca de longo prazo.

Como diz o velho ditado, é como procurar as chaves perdidas embaixo do poste só porque ali tem luz — o que é visível (números de curto prazo) é o que ganha atenção, mesmo que o verdadeiro valor esteja nas sombras do longo prazo.


Existe Solução? Sim. Mas Requer Coragem.

Empresas precisam reconhecer o valor intangível da marca como um ativo estratégico — e protegê-la com a mesma atenção que dedicam ao caixa ou aos estoques.

Alguns caminhos possíveis:

  1. Nomear um verdadeiro guardião do brand equity, com autoridade real e metas alinhadas ao futuro da marca.
  2. Investir em pesquisas consistentes sobre percepção, lealdade, diferenciação e relevância da marca.
  3. Criar indicadores de longo prazo confiáveis, que possam coexistir com as métricas financeiras imediatas.
  4. Voltar a investir em publicidade institucional e narrativa de marca, mesmo que o retorno leve mais tempo.
  5. Evitar promoções desenfreadas que deterioram o posicionamento da marca e criam dependência do desconto.

O Branding Ainda Importa. Talvez Mais do Que Nunca.

Mesmo em um cenário acelerado e orientado a dados, as marcas ainda são o maior ativo estratégico de uma empresa. São elas que garantem margem, preferência, lembrança e defesa diante de crises.

A boa notícia é que reconstruir uma marca é possível — mas exige intenção e paciência.

A má notícia? Poucas empresas estão dispostas a esperar o tempo necessário.


Reflexão final:
Se a sua empresa está crescendo com base em promoções, pense duas vezes. Pode ser que você esteja vendendo hoje… e matando sua marca amanhã.

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