Juliana Trintin

O Papel das Marcas: De Tambores de Uísque à Guerra por Atenção no Século XXI

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“Uma marca é muito mais do que um nome bonito – é um escudo, uma promessa, uma história.”


Antes de Tudo, Uma Marca É… Proteção

O que faz você reconhecer um produto como confiável? O nome? O logo? A embalagem? Ou seria tudo isso junto?

A verdade é que uma marca é uma combinação de sinais que diferencia um produto de seus concorrentes. Ela não serve apenas para dar um nome ao que vendemos. Desde os tempos mais antigos, as marcas surgiram como instrumentos de proteção – tanto para o consumidor quanto para o produtor.

No Império Babilônico, já havia registros de tijolos identificados com nomes de seus artesãos. Na Europa medieval, os símbolos dos guilds (ou corporações de ofício) eram gravados em produtos como um selo de autenticidade. Já no século XVI, os produtores de uísque começaram a marcar os barris com seus nomes — literalmente queimados na madeira — para evitar substituições por bebidas adulteradas.

Não era apenas marketing: era sobrevivência.


Do “Old Smuggler” à Era da Publicidade

Em 1835, surge a marca Old Smuggler, um Scotch que tentava se associar à reputação dos destiladores ilegais que, apesar da clandestinidade, entregavam qualidade superior. Esse movimento foi um dos primeiros indícios do que conhecemos hoje como associação de marca: usar uma narrativa ou uma reputação para agregar valor ao produto.

Mas foi só no século XX que o jogo mudou completamente. A chegada da publicidade em massa e da mídia eletrônica transformou o branding em arma estratégica. Empresas deixaram de vender apenas produtos e passaram a vender significados.


De Produto a Experiência: A Revolução do Branding

Em um mercado saturado de alternativas, o preço deixou de ser o único critério de escolha. As marcas passaram a criar diferença percebida — algo que vai além da qualidade objetiva e mexe com emoções, valores e identidade do consumidor.

Para isso, entraram em cena:

  • Pesquisas de mercado para entender o que importa para as pessoas;
  • Design de embalagem como extensão da proposta de valor;
  • Publicidade emocional, contando histórias em vez de apenas mostrar atributos;
  • Distribuição estratégica, para estar no lugar certo, da forma certa, na hora certa.

O objetivo? Fazer com que o cliente sinta algo ao ver a marca. Porque um bom produto pode ser copiado. Uma marca forte é única.


O Valor Invisível (Mas Bilionário) das Marcas

Para entender o poder real das marcas, basta olhar os números.

Quando a Kraft foi vendida por US$ 13 bilhões, estava sendo negociada por mais de 600% acima do seu valor contábil. Não era pelo maquinário, nem pelos ativos físicos. O que estava em jogo era algo invisível, mas palpável: o valor da marca.

Outro exemplo: em 1988, a Sunkist gerou mais de US$ 10 milhões em royalties apenas com o licenciamento de seu nome. Produtos como doces, refrigerantes, sucos e suplementos usaram a marca Sunkist para se diferenciar no ponto de venda e, mais importante, na mente do consumidor.


Por Que Hoje É Tão Difícil Criar Uma Marca de Verdade

Se as marcas valem tanto, por que não criar uma do zero?

Simples: porque hoje é muito mais caro, difícil e competitivo do que há algumas décadas.

Veja o cenário atual:

  • Custo de mídia nas alturas: comerciais de 30 segundos já são considerados inviáveis para marcas iniciantes.
  • Concorrência brutal: só nos supermercados, cerca de 3.000 novas marcas surgem por ano.
  • Saturação de categorias: existem mais de 750 modelos de carros, 150 marcas de batons e 93 marcas de ração para gatos.
  • Disputa pelo canal e pela mente: estar na prateleira já não basta — é preciso estar na lembrança e no coração do consumidor.

Resultado? Muitas marcas nascem pequenas e acabam presas em nichos, sem fôlego financeiro para investir em campanhas massivas. A construção de uma marca hoje exige paciência, estratégia e consistência a longo prazo.


Reflexão Final: O Verdadeiro Papel das Marcas

No fim, as marcas existem para reduzir incertezas. Em um mundo caótico, elas oferecem um atalho emocional e racional para decisões de compra. Elas são promessas públicas de qualidade, identidade e experiência.

Por isso, mais do que nunca, o branding não é cosmético. É estratégia central. Quem entende isso, constrói algo maior do que um produto — constrói um legado.

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